Crítica à noção de ligação (bonding) no ser humano

O autor destaca os estudos de John Kennell e Marschall Klaus (1979) como um dos estudos que representa bem o objetivo de demonstrar a existência e importância da ligação/bonding. Segundo esses estudiosos, o contato físico imediato da mãe com seu bebê pode favorecer o aparecimento do comportamento maternante, aumentaria a chance do estabelecimento do aleitamento materno e, conseqüentemente, a saúde do bebê seria melhorada. Para esses autores, existe um período sensível para o estabelecimento dessa ligação/bonding, no qual seria desencadeada uma série de interações responsável pelo estabelecimento de uma forte ligação entre a mãe e o bebê.
Uma outra autora, Wenda Trevathan, também ressalta as múltiplas vantagens do contato imediato da mãe e do bebê para a regulação fisiológica do bebê (temperatura, respitaração, batimentos cardíacos) e da mãe (a liberação da ocitocina estimulam a expulsão da placenta, diminui a chance de uma hemorragia pós-parto, e favorece a descida do leite).
Para Robbie Davis-Floyd, esses estudos favoreceram a mudança da rotina nas maternidades, uma vez que colocando em destaque a importância do contato imediato da mãe com bebê, questionam, especialmente, a forma de alojamento que separa a mãe do bebê. A partir de então, vê-se as maternidades praticando o "roming-in" (ou alojamento conjunto). No entanto, essa mesma autora aponta que a apropriação médico-científica dessa noção é uma tentativa de recuperar o poder simbólico, por parte do médico e dos dispositivos hospitalares. A prática de entregar o bebê para a mãe - "toma teu bebê, cuide-o e se relacione com ele" - além de fazer parte de um ritual de passagem que sinaliza para a sociedade que a transformação daquela mulher em mãe está completa, e de que ela é uma boa mãe quando se ocupa e se vincula imediatamente ao seu filho, devolve ao dispositivo médico-hospitalar o poder sobre o nascimento e a maternagem (pois determina quando e como).
As instituições médico-científicas, segundo Davis-Floyd, contudo, desempenham um papel paradoxal: ao mesmo tempo que defendem o alojamento conjunto, questionam a noção do "período sensível", ainda mantendo a rotina hospitalar de não permitir o contato imediato da mãe com bebê (ainda são comuns os protocolos de berçário e as rotinas de centro obstétrico). Para esta autora, esta também é um conduta que visa manter o poder médico.
Apesar de muito estudos que destacam a importância do período sensível para regulação fisiológica da mãe e do bebê (conforme citada acima), a extensão da noção de ligação/bonding para a espécie humana não evidente. Para muitos autores, a ligação/bonding, ou melhor, o estilo de maternagem varia significativamente em relação ao sistema de organização social da espécie. Por exemplo, segundo Sarah H. Blaffer, a ligação/bonding é importante para as ovelhas porque elas vivem em bandos compostos por indivíduos que não possuem necessariamente alguma relação de parentesco. Apoiada na sociobiologia (que postula que os genes são essencialmente egoístas), ela afirma que a ligação/bonding é a garantia para a mãe de que o filhote que ela cuida tem parentesco genético com ela.
O que é importante destacar é o caráter variável da ligação mãe-bebê de acordo com a espécie e suas respectivas organizações sociais. Algumas espécies de primatas, por exemplo, praticam a exclusividade da relação mãe-bebê; outras espécies, os cuidados com os filhotes são compartilhados entre as fêmeas. Pode-se, enfim, afirmar que não se deve generalizar as conclusões dos estudos com carneiros para a espécie humana. Segundo o autor, os conflitos entre a história biológica e a história cultural, com os quais se defrontam os humanos, precisam ser levados em conta.
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