quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

O amor materno...um amor imperativo (parte 4)

Crítica à importância da "preocupação materna"

A preocupação materna é, portanto, vista como uma função adaptativa essencial para garantir que as necessidades do bebê sejam adequadamente atendidas. Para o autor, não há dúvida de que essa preocupação é desencadeada por provenientes da mãe (hormônios) e do bebê (apelos). Pode-se ver que essa função adaptativa implica a mãe e o filho, e é inerente à natureza humana. Essa noção é largamente divulgada pela mídia. A importância dada a essa relação, que se supõe desenvolver a partir do nascimento do bebê, no entanto, não considera o fato de que o ser humano também demonstra uma relativa independência da sua natureza.

“O interesse do adulto em cuidar de uma criança pequena pode perfeitamente aparecer na ausência dos hormônios e do contato pós-natal imediato, como por exemplo na adoção; ou, quando o acesso à mãe nos primeiros meses de vida se encontra impedido.” (p.93) Qual seria, então, o impacto sob o desenvolvimento da criança quando esse contato imediato se acha impedido por um nascimento de alto risco, por uma prematuridade severa, ou se existe a necessidade de freqüentar uma creche ou ser cuidado por uma outra pessoa? A crítica do autor recai, então, sobre “essa literatura sentimentalista” que “alimenta a inquietude dos pais” utilizando como argumento central o fato de que existe uma determinação da natureza para esse attachement/apego, que ele é condição sine qua non de um desenvolvimento saudável, mas desconhece que a cultura subverte à natureza; que a dupla condição do homem – natureza e cultura – dá a ele uma certa independência em relação às determinações biológicas da espécie.


A fim de embasar seu questionamento, Blaise Pierrehumter, cita alguns experimentos conduzidos pelos teóricos da teoria do attachement/apego (sucessores de Bowlby) que tem como objetivo demonstrar “a importância da disponibilidade, da acessibilidade e da sensibilidade maternas durante os primeiros meses de vida, no que se refer ao estabelecimento de uma relação de attachement/apego de qualidade entre o bebê e sua mãe”. (p.93) O primeiro experimento citado foi conduzido laboratorialmente por Ainsworth e Witting(1969) que tinha como objetivo qualificar o vínculo entre o bebê e seu principal cuidador. O teste, denominado “Teste de Situação Estranha”, permitiu verifica quais eram as manifestações comportamentais de attachement/apego, além de examinar o equilíbrio entre o comportamento exploratório e o attachement/apego, estando a criança em situações de alto e baixo estresse.

Esse experimento foi realizado em crianças de 12 meses. Essas crianças eram submetidas a uma breve separação da mãe, durante ao qual ficava em companhia de uma pessoa não familiar. A partir dessa situação inicial, passou-se a observar como se dava o comportamento exploratório da criança na ausência da mãe e no seu retorno. Além disso, foi possível observar quais eram as reações dessas crianças à retirada e ao retorno da mãe. Esse estudo demonstrou que o attachement/apego varia de acordo com o tipo de cuidado materno e é influenciado pelas características do bebê. Foi possível, também, classificar a qualidade relacional do bebê com sua figura paterna em 3 tipos de attachement/apego (segundo as reações ao retorno da mãe). São eles:

1. O “attachement/apego seguro”: a criança protesta a ausência da mãe; saúda efusivamente seu retorno e volta a brincar.
2. O “attachement/apego inseguro-evitante”: a criança explora o ambiente sem recorrer à mãe como uma “base segura”, e nem mesmo procura se assegurar de sua presença.
3. O “attachement/apego inseguro-ambivalente”: a criança se mostra terrivelmente perturbada com a situação, ficando muito ansiosa ou agitada com a separação. Apesar de buscar contato com a mãe no seu retorno, esta não consegue acalmá-lo devido à sua cólera, suas reações ambivalentes ou à sua afliação.
Com o objetivo determinar como se daria a relação de attachement/apego entre mães e bebês que se encontraram impedidos de terem contato imediato, ou melhor, quais seriam as implicações dessa ausência de contato – prematuridade, adoção – nos primeiros meses de vida extra-uterina, Ayala Nicole (1999) conduziu o “Teste da Situação Estranha” com bebês prematuros a fim de comparar os resultados com os encontrados nos experimentos com bebês nascidos a termo. Foram 12 estudos, e os achados foram os seguintes:
  • Em oito deles, não houve diferença entre os 2 grupos;
  • Nos outros quatro, foi possível verificar algumas diferenças, que deixam de ser significantes porque a pesquisadora concluiu que fatores sócio-econômicos interferiram nos resultados.

A conclusão final é que a ausência do contato imediato não altera significativaente a qualidade da relação de attachement/apego entre a mãe e o bebê.

Inúmeros experimentos também foram conduzidos para avaliar o impacto da ida precoce à creche na qualidade da relação de attachement/apego. Os primeiros estudos realizados nos EUA, nos anos 70-80, indicavam que a inserção precoce – no primeiro ano de vida - da criança numa creche contribuiria para a insegurança na relação com a mãe.

Estudos realizados pelo NICHD Early Child Care Research Netwok, 1997) concluíram que os indicadores habitualmente usados nesse gênero de estudos não possuem efeito significativo na qualidade da relação de attachement/apego à mãe. Ou seja, o tipo de guarda (creche coletiva, creche familiar ou guarda familiar) não são fatores relevantes para se determinar a qualidade do attachement/apego.

A equipe de Pierrehumter desenvolveu um estudo procurando verificar se o fato da criança permanecer sob os cuidados de parentes – guarda parental - ou sob os cuidados de profissionais da creche – guarda não parental - influenciaria a qualidade de attachement/apego. Os resultados encontrados foram surpreendentes: a guarda não parental pode ter um efeito benéfico para as crianças que, por qualquer razão, desenvolveram uma forma de attachement/apego inseguro com sua mãe ( as crianças avaliadas tinha 21 meses). Aos 5 anos, aquelas crianças “inseguras” que ficaram muito tempo sob guarda não parental demonstraram menos problemas comportamentais. Contrariamente ao que poderia se supor (e ao que supõe certo tipo de orientação “sentimentalista”), “o efeito potencialmente nocivo de um má qualidade do attachement/apego à mãe é neutralizado naquelas crianças que foram submetidas durante mais tempo à guarda não parental”. (p.97)










Données dePierrehumbert et al. (1996) :
attachement, garde et problèmes de comportement (à 5 ans)



Um outro estudo conduzido por esta equipe filmou 50 crianças – de 3 a 24 meses - durante 3 meses em diversas situações nas quais estavam sob cuidados da sua mãe ou de uma educadora, da avó ou de uma babá. Verifico-se que as crianças procuravam estabelcer contato (rastejar em direção, sorrir, vocalizar, etc) igualmente com a mãe e com a babá. As curvas do gráfico que indicam cada uma dessas situações – contato com a mãe e contato com a babá – são praticamente sobrepostas. Para o autor, esse resultado também demonstra a importância da instituição de acolhimento como lugar de socialização da criança.



Données de Pierrehumbert et al. (1991) :
intensité de contact positif avec la mère et la gardienne, entre 3 et 24 mois

Figura: Vert et bleu de Marie Lydie Joffre

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